quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

Em busca da identidade perdida


"Só há duas opções nesta vida: se resignar ou se indignar" (Darcy Ribeiro)


Tenho lido, visto e ouvido muita coisa ultimamente dentro de uma busca de entender o processo de construção de nossa identidade, seja como pessoa seja como país. O vídeo do Fernando Meireles, que reproduzo aqui, é um exemplo disto.

Pelo que observei, a maioria das pessoas acredita que a construção de nossa identidade implica numa busca para dentro de nós mesmos, num processo de auto-conhecimento, de um certo isolamento. 

Será?

Num belo texto, Luiz Eduardo Soares aponta em outra direção. Para ele, "identidade é uma palavra enigmática: por um lado significa a originalidade de alguém, a singularidade que torna cada pessoa incomparável e única; por outro lado, adquire o sentido oposto ao designar a semelhança que aproxima duas pessoas". A busca dolorosa de um adolescente por sua identidade, do que o distingue dos seus pais e o torna um ser humano integral é o exemplo que todos nós vivenciamos do primeiro significado da palavra. A nossa eventual identificação com as idéias e ações de Gandhi, Chico Buarque ou Jesus Cristo é um exemplo do segundo.

Mas como Luiz Eduardo aponta, mesmo nossa originalidade, ou as características que nos tornam únicos, só fazem sentido diante do outro: "É a generosidade do olhar do outro que nos faz únicos... Nós nada somos e valemos nada se não contarmos com o olhar alheio acolhedor, se não formos vistos e percebidos pelo outro". Daí que a construção da identidade de uma pessoa é necessariamente um processo social, interativo, coletivo. Não há identidade no que Luiz Eduardo chama de homem-ilha ou numa mulher-ilha, não há identidade desvinculada de relações humanas que lhe dão sentido e valor.

Todo este papo para dizer que se a construção da nossa identidade se faz na relação com outras pessoas, é claro que quanto mais interessantes e instigantes forem estas pessoas com quem interagimos, melhores e mais interessante poderemos ser. Isto vale para nós, indivíduos, e vale para nós enquanto país. Isto não deve nos levar a rejeitar as pessoas "menos interessantes", a construir relações elitistas mas, ao contrário, deve nos fazer valorizar a busca de relações mais intensas e verdadeiras com pessoas que nos agreguem  coisas novas. Devemos compreender que a diversidade nas relações nos permite ser pessoas mais interessantes e complexas. 

Como nos lembra Darcy Ribeiro, uma das grandes vantagens comparativas do Brasil, no século XXI é sermos
"um povo mestiço na carne e no espírito, já que aqui a mestiçagem jamais foi crime ou pecado. Nela fomos feitos e ainda continuamos nos fazendo. Essa massa de nativos viveu por séculos sem consciência de si... Assim foi até se definir como uma nova identidade étnico-nacional, a de brasileiros...
Por isso mesmo, o Brasil sempre foi, ainda é, um moinho de gastar gentes.Construímo-nos queimando milhões de índios. Depois, queimamos milhões de negros. Atualmente, estamos queimando, desgastando milhões de mestiços brasileiros, na produção não do que eles consomem, mas do que dá lucro às classes empresariais.
Dizem, também, que nosso território é pobre - uma balela. Repetem, incansáveis, que nossa sociedade tradicional era muito atrasada - outra balela. Produzimos, no período colonial, muito mais riqueza de exportação que a América do Norte e edificamos cidades majestosas corno o Rio, a Bahia, Recife, Olinda, Ouro Preto, que eles jamais conheceram. Nosso povo preservará, depois dessa drástica cirurgia, a vitalidade indispensável para sair do atraso ou estará condenado a afundar cada vez mais no subdesenvolvimento? Quem está interessado em que o Brasil seja capado e esterilizado? Serão brasileiros?
Podemos olhar para esta crise que o país está vivendo e nos resignar. Dizer que "foi sempre assim", "que estes políticos são todos iguais"... Ou podemos reconhecer que sempre foi assim e que nossos políticos são igualmente medíocres e nos indignar. Buscar outros caminhos. Ao invés de ficar esperando um "salvador da pátria" podemos, cada um de nós, identificar onde pode contribuir e tentar fazer a sua parte. Porque afinal, como diria meu avô, quem espera nunca alcança...





Vídeo IDENTIDADE, de Fernando Meireles

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